sexta-feira, maio 23, 2008

Ares do Índico - part 17


Dia Mundial do Trabalhador

Dia Mundial do Trabalhador. Ninguém trabalha. Este ano para ajudar à festa, a sexta-feira faz de ponte para um fim-de-semana prolongado e umas merecidas mini ferias para todos os trabalhadores do mundo, ou pelo menos assim deveria acontecer na teoria! Moçambique não é excepção. Tudo começa como um dia de festa. A população sai para as ruas, cada empresa agrupa os seus trabalhadores desde o director geral ou equivalente até ao empregado no fim da linha, e tornam a cidade colorida durante um dia. Como se de uma espécie de jogos olímpicos de empresas se tratasse, em que nenhuma quer ficar em ultimo! Chapéus, t-shirts, bandeirolas e cartazes, muitos cartazes, grandes e pequenos. Neste dia não existem patrões nem empregados mas sim trabalhadores. Todos juntos saem pelas ruas para festejar. Celebrar. Comemorar. Eu para ser sincero vou de férias, ou pelo menos pedir o máximo de ajuda possível a S. Pedro para dar uns dias de sol e bom tempo para poder aproveitar a praia e as mini ferias. Faço parte da classe operaria à relativamente pouco tempo, mas nunca deixei de comemorar o dia do trabalhador com umas ferias, sempre que possível. Trabalho é trabalho, conhaque é conhaque. Mas quando é conhaque, é conhaque à seria! Feriado significa descanso e dolce fare niente. Mas são mais do que muitos, são a maioria aqueles que saem de casa e se juntam por cores, emblemas, logótipos e hinos para festejar durante uma longa marcha o orgulho que têm em vestir a camisola, trabalhar por ela e para ela. Aumentar as hipóteses de poder fazer a diferença. Aprender todos os dias um pouco mais e ensinar algo de novo todos aqueles que vêm de longe, para desafiar tudo e todos e provar que temos muito a aprender uns com os outros, mesmo quando isso parece ser impossível e inaceitável. Apesar de passar por todas estas experiências que tornam o facto de trabalhar em Moçambique um desafio bastante gratificante e enriquecedor, o meu Dia Mundial do Trabalhador vai ser igual e passado da mesmo forma independentemente do lugar do mundo onde estivesse, na praia deitado, na praia estendido. É assim o meu feriado e recomendo vivamente a quem tem possibilidades para isso de o fazer desta forma e se possível em Moçambique, que nesta altura continua ainda com bom tempo e muitas razões para as tão esperadas mini férias.


in: Semanário Económico, CASUAL

Ares do Índico - part 16

Relíquias de Lourenço Marques

Pérolas do passado, jóias do presente. Em cada rua, em cada esquina, em todas as cidades de Moçambique encontramos uma obra de arte esquecida e ignorada por quase todos. Quase todos! Arquitectos, engenheiros, pintores, músicos e muitos mais. Todos artistas e todos deixaram a sua marca. Nem os anos nem a destruição da guerra conseguiram anular as imensas preciosidades que foram deixadas pelos nossos artistas de outras épocas. Depois de tantos anos e de uma evolução desenfreada, ainda é possível dizer que a herança deixada em Lourenço Marques torna Maputo numa cidade de encantos. Os portugueses agora são tugas. Os senhores agora são bosses! Aos poucos e poucos a história repete-se e tudo volta ao que era, ao que foi. Quem partiu levou na lembrança tudo aquilo que jamais voltou a encontrar, e quem chega procura pelo que possa ter ficado de quem já partiu. Não existe ninguém que não tenha uma boa história para contar, uma grande aventura para relembrar os bons velhos tempos, as relíquias de Lourenço Marques, as jóias de Moçambique. Mas agora é a nossa vez. Não de relembrar a historia mas sim de começar uma de novo, do principio. Criar aquilo tudo que será lembrado daqui a muitos anos, por todos aqueles que ainda estão a ser projectados para um dia herdarem o que é nosso, alguns já vêem a caminho! Do Maputo ao Rovuma perdem-se de vista as memórias e as lembranças dos tempos incríveis vividos ao segundo e ao sabor do momento. Agora desespera-se para poder acompanhar o passo do futuro, desenvolver ao máximo tudo o possível e imaginário na esperança de poder alcançar o passado, ou pelo menos conseguir fazer o suficiente para quando a altura do descanso merecido chegar, conseguir saborear aquilo tudo que há muitos anos foi um paraíso esquecido. Lá. Onde o sol se põe ao contrário e onde as horas não mudam, nem no verão nem no inverno. Lourenço Marques foi há muito tempo. Maputo tenta esquecer e acompanhar a evolução. Quem vem quer as pérolas de Lourenço Marques, mas paga pelas jóias de Maputo na esperança de conseguir fazer com que o tempo ande para trás, para as lembranças do passado. As casas lindas de morrer, sumptuosas ao ponto de não ser possível imaginar como alguém pôde ter ousadia para tanto. Monumentos que mais parecem deslocados de outras partes do mundo e plantados em Moçambique com um precisão de artista. Memórias que não acabam nunca e que continuam a fazer com que este país se torne numa caixa de surpresas para quem aqui chega, pela primeira vez ou pela primeira vez depois das outras vezes todas.


in: Semanário Económico, CASUAL

Ares do Índico - part 15

Quem manda aqui?

Durante as ultimas semanas que as discussoes tem sido acesas com alguns colegas de trabalho sobre o verdadeiro desenvolvimento de Moçambique e a imagem que o mundo tem deste país africano em franco desenvolvimento. As visitas oficiais de vários chefes de estado vão sucedendo ao longo do tempo e as promessas da praxe vão sendo cada vez mais e os elogios bastante encorejadores. Mas ainda se faz muita protecção a tudo o que vem de fora e muitas vezes, quem sofre na pele são aqueles que por razões profissionais, filosofias de vida, destinos do acaso ou mesmo por escolha própria em regressar para junto das raizes chegam a Moçambique à espera de encontrar uma sociedade aberta ao que é novo como forma de aprender aquiloque perdeu nos ultimos anos de guerra e sofrimento. Todos os estrangeiros que chegam confrontam-se com inumeros obstaculos para conseguir trabalhar, viver e até investir em Moçambique. O poder é cada vez mais de todos os aqueles que possuem dinheiro em deterimento dos estudos ou experiencia de trabalho, se assim se pode chamar! A evolução e a globalização da economia assim ditou as regras, fazendo com que se veja uma caça ao tesouro em tudo o que se pode imaginar. É justo. Mas outros fenomenos aconteçem em paralelo a esta evolução. É engraçado como muitas pessoas tambem olham para estes paises mais carentes de evolução e de investimento e até mesmo de educação qualificada em postos estratégicos como uma forma se agarrarem o poder de qualquer coisa. Com uma experiencia de trabalho ainda na fase crescente, mas já com algumas empresas de renome no curriculum, foi me possivel sentir como as pessoas vêm alguem que vem de fora para trabalhar, desenvolver, liderar, expandir, despedir, ensinar, aprender, ajudar e acima de tudo fazer pela vida em termos economicos. Uns tem sucesso e conseguem atingir estes objectivos todos e muitos mais dando a alegria e satisfação a todos aqueles com quem trabalham, e por outro lado temos os chefes, patrões ou como aqui são carinhosamente chamados, os bosses (patrão em inglês). Para alguns é como peixe fora de água que não consegue de maneira nenhuma atigir um objectivo que nunca foi possivel em outro lado e que aqui parece ser uma meta a atingir, mas muitas vezes, a maioria delas sem sucesso nenhum e com resultados hilariantes a todos os niveis, incluindo os laborais. Outros, já com alguma bagagem e com pretensões bem maiores vão conseguindo ir ganhando um lugar de destaque como lideres de qualquer coisa que ninguem vê, a não ser a empregada lá de casa ou o porteiro da empresa! Mas o verdadeiro patrão é aquele que faz juz ao verdadeiro empresário de import/export, o Quim Fintas que consegue dar a volta a tudo e todos e por fim acaba enrolado nos seus proprios esquemas. Não são só os estrangeiros a seguir este modo de vida, mas são eles que protagonizam as imagens mais caricatas e muitas vezes imortalizadas pelos risos e gargalhadas dos seus proprios “empregados”. Se calhar tem tudo a ver com a forma como o sol gira e pelo aquecimento da água do mar, mas a verdade é que cada vez mais se encontram verdadeiras aves raras de todas as idades, sexos e nacionalidades. Quem não fica a ganhar são todos os outros que andam em Moçambique a lutar pela vida e que aos poucos e poucos se vêm comparados a pequenas excepções que mancham o bom trabalho e excelentes desempenhos em muitas áreas, passando despercebidos aos olhos de todos mas que levam por tabela com todos os preconceitos e julgamentos de opiniões. Mas se não fossem estes pequenos episódios cheios de personagens brilhantes, que graça teria a vida fora de Portugal ou dos paises de origem de todos os outros que servem de figurantes nesta série da vida real? Os tempos mudam e as vontades tambem e chefe que é chefe não deixa os seus créditos em mãos alheias, mesmo quando os tempos são dificeis!

in: Semanário Económico, CASUAL

Ares do Índico - part 14

Visita Oficial

Durante as férias da Páscoa muitos portugueses aproveitam para umas mini férias, dentro ou fora de Portugal, algumas vezes conciliando até o trabalho com as férias para fazer rentabilizar o tempo e o dinheiro! Em Moçambique, todos os portugueses que aqui trabalham e residem, tiveram a oportunidade de conhecer e conversar com o Presidente da Republica de Portugal, Dr. Aníbal Cavaco Silva. Depois de umas merecidas férias pelas praias moçambicanas, a visita de estado decorreu durante três dias e sempre com várias memórias do passado, da altura em que o nosso Presidente da Republica viveu em Moçambique. A casa onde viveu durante dois anos, a escola onde a Primeira-dama deu aulas e outras curiosidades. Foi muito bom viver durante três dias mais perto de todos aqueles que representam o nosso país e que levam a bandeira de Portugal além fronteiras.
A comitiva incluía vários investidores e empresários portugueses, alguns com negócios em Moçambique e outros com muita vontade de investir neste belo pais africano que cada vez apresenta mais oportunidades de negócio de vido ao seu crescimento sustentado e com uma politica interna cada vez mais estável, assim como a própria segurança interna que se tem relevado mais eficaz. Vários acontecimentos tiveram lugar durante estes três de visita oficial. Seminários sobre a língua portuguesa e comunicação com algumas figuras publicas da comunicação, jornalismo e governo, como ex. ministros da cultura e da educação. Um belíssimo concerto de Maria João e Mário Laginha, com um auditório esgotadíssimo e a rebentar pelas costuras. Várias empresas aproveitaram para reunir e apresentar produtos, serviços, soluções e outros negócios a todos os potenciais investidores interessados em Moçambique. E claro a recepção oficial ao Presidente da Republica na Escola Portuguesa de Moçambique, onde todos os portugueses em território moçambicano forma convidados para estar com o Dr. Aníbal Cavaco Silva. Foi muito bom para todos os portugueses que costumam celebrar a Páscoa com a família ou mesmo aproveitar para uns dias de descanso, sentir em Moçambique que Portugal esteve tão perto de todos nós e ajudou a tornar esta altura do ano bem mais agradável e na despedida sempre com uma lágrima no canto do olho! Penso que das últimas vezes que este saudosismo aconteceu em Moçambique, foi mesmo em 2006 durante a vista da equipa do Benfica para alguns jogos de preparação e exibição junto da grande massa associativa que existe neste país africano. É possível encontrar por alguns restaurantes e cafés mais típicos e turísticos da antiga Lourenço Marques, camisolas e posters assinados por jogadores, treinadores e presidente do clube. Como qualquer benfiquista é um grande orgulho poder ver a grandeza do clube além fronteiras e a união que provoca entre a comunidade portuguesa, só é pena os resultados não corresponderem á dedicação dos adeptos, mas isso fica para outras estórias. A semana ficou ainda marcada pela chegada da Primavera a Portugal e do Outono a Moçambique. A mudança da hora que encurta para apenas 1 hora de diferença que facilita tanto no trabalho como nas horas de lazer, em que já não é preciso ficar até de madrugada para ver o telejornal ou os jogos de futebol! Em Moçambique não se brinca com as horas nem diferenças horárias, depois de algumas conversas e discussões, fiquei a saber que a opinião sobre estes tema não é nada boa por parte da população mais antiga que vê neste acto um despeito pelo destino e pelas crenças mais nobres. Mexer com o tempo como eles dizem, nem vale a pena falar, muito menos imaginar!


in: Semanário Económico, CASUAL

Ares do Índico - part 14

Migração ou não?
Que todos os jovens ou uma grande parte deles olham cada vez mais para o estrangeiro como uma oportunidade de trabalho e de uma vida melhor, já se sabia há algum tempo. A cada dia que passa, é impressionante ver a quantidade de pessoas com menos de 30 anos que chegam a Moçambique, através de Maputo à procura de oportunidades novas e diferentes. De todas as nacionalidades e cantos do globo vão chegando de carro, avião ou de boleia diversas pessoas que desistiram e abandonaram tudo na sua terra natal para encontrar em África desafios e realizações pessoais. Técnicos de acção social encontram aqui uma diversidade gigante de oportunidades, muitas delas fora dos centros urbanos onde tudo falta e ainda nada chegou, resultado de um desenvolvimento bastante mal sustentado. Economistas e gestores encontram em diversas empresas e organizações não governamentais trabalho e na maioria das vezes uma oportunidade única de poder trabalhar e ao mesmo tempo transmitir todos os ensinamentos adquiridos. Advogados exercem aqui em Moçambique as leis praticamente comuns aos dois países, Portugal e Moçambique. Designers, realizadores, publicitários e afins dão uma ajuda preciosa no desenvolvimento dos negócios e da própria imagem do país. É mesmo impossível não encontrar um estrangeiro em quase todas as grandes empresas de referência em Moçambique, assim como em certos negócios mais especializados. Apesar de África possuir características absolutamente únicas, o aumento do desejo em trabalhar, viver e experimentar um tipo de vida que não é fácil e muitas vezes angustiante ao ponto de desistir e voltar ao ponto de partida. Não é para todos ou para qualquer um. É preciso ter um grande jogo de cintura, saber contornar as dificuldades e enfrentar com um sorriso na boca os desafios do dia a dia. Quem não gosta de viver praticamente o ano inteiro com sol e calor? Trabalhar a cinco ou dez minutos de distância de casa, onde é possível ir almoçar todos os dias. Deixar os filhos em casa ou na escola e passar com eles grande parte dos dias! Viajar quase todos os fins-de-semana para praias desertas e paradisíacas a um custo relativamente baixo. Em época de Páscoa em Portugal, ficam aqui alguns aperitivos que podem ajudar algumas mentes indecisas a experimentar no estrangeiro aquilo que não se consegue encontrar mais perto de casa! Infelizmente em Moçambique não existe o feriado da Páscoa e os respectivos ovos, e o coelhinho da Páscoa foi com o Pai Natal ao circo e ainda não voltou! A família começa a ser substituída nestas alturas pelos amigos e colegas de trabalho que fazem com que os festejos sejam diferentes e mais descontraídos. Num país onde o significado da família é bastante grande e as próprias famílias são ainda maiores, quem está acostumado a viver estes feriados especiais e tradicionais, aprende a ajustar a roupa ao feriado e a praia como pano de fundo para qualquer celebração. Natal, Ano Novo, Carnaval, Páscoa, São Martinho e por aí em diante, é sempre na praia! Resumindo e concluindo, para quem pensava que nas ex-colónias apenas se encontrava a velha guarda portuguesa engana-se. Grandes novos talentos andam à solta em África, trabalhando, ensinando e formando na medida do possível um povo sedento de informação e de novas oportunidades de aprendizagem com aqueles que têm uma perspectiva do mundo com outros olhos. Se ao menos o preço das viagens fosse mais barato, ainda pensava ir a Portugal matar saudades de umas amêndoas e de uns ovos da Páscoa!

in: Semanário Económico, CASUAL

Bilene - Abril 2008

Se tivesse em Portugal era como ir passar o fim de semana à Lago de Albufeira, mas em Moçambique chama-se Bilene. Tem praia e tem uma lagoa. A praia é para os ricos que têm barco e a lagoa é para os outros que nadam. É preciso muita imaginação para conseguir passar o tempo num lugar onde a água mexe menos que um coxo, sem querer ofender os coxos que não têm nada a ver com isto, apenas como comparação.
Para variar o tempo estava muito bom, ou não se chamasse este país de Moçambique, onde apesar de todas as maravilhas, cada vez mais dificeis de encontrar, do tempo nunca nos podemos queixar. Esteja tudo bem ou tudo mal, podem andar todos à chapada no meio das ruas por causa dos preços dos transportes ou por rebentarem armazéns de armas, mas o tempo está sempre uma maravilha. Até para os policias isto é maravilhoso, é raro estar mau tempo e chover, só de noite, por isso nunca precisam de suspender as actividades de ficalização mais ou menos "refrescantes". (refresco é o nome dado por eles ao suborno, raramente é oferecido pelos cidadãos e na grande maioria dos casos é pedido pelos policias!!)
Voltando ao que interessa, o fim de semana foi muito bom, muito sol e muito descanso, a comapnhia bastante agradável e mais uma voltinha do Tomás pelas terras suecas!!! Ainda não nasceu mas já se farta de passear. Aqui já estava com - 4 meses antes de pôr a cabeça de fora!

Ares do Índico - part 13

Macaneta

Fim-de-semana. Muito calor. Praia. Aventura. Em Moçambique é assim que começa a descrição de mais um fim-de-semana como muitos outros durante o ano. Apesar do verão estar quase a acabar, pelo menos segundo o calendário das estações do ano, o calor não deixa de aumentar e de se fazer sentir durante o dia e mesmo durante a noite. Nada melhor do que aproveitar os dois dias de descanso por semana para ir até à praia carregar as baterias e viver algumas aventuras que quebram as rotinas do dia a dia. Em Maputo a praia mais próxima é a da Costa do Sol, situada na marginal da cidade e que foi famosa à muitos anos atrás quando ainda estava virgem e imaculada! Agora, é preciso fazer alguns quilómetros e sair da cidade de Maputo para chegar até à Macaneta, uma praia que faz lembrar um pouco as praias da Costa Alentejana de Portugal, mas com muitas diferenças pelo caminho! Como fica situada numa ilha, é preciso atravessar o rio através de um batelão, barco quase semelhante a um ferry-boat mas apenas de nome. Leva 6 carros de cada vez e as pessoas que couberem. Uma viagem curta, cerca de 10 a 15 minutos consoante a força da corrente e muitos nenúfares a deslizar de um lado ao outro da margem consoante as dinâmicas das marés. Depois de atravessada a margem, alguns quilómetros de picada através de mato e dunas até chegar a uma praia com milhares de metros de extensão, sem alma viva e a mais pura sensação de ter chegado a um pequeno paraíso no meio da selva urbana. Água incrivelmente quente e apenas o mito dos tubarões fazem com que nunca se deixe de ter pelo menos um pé na areia para ajudar a fugir do peixinho! Não se ouve o senhor dos gelados da Olá nem das deliciosas bolas de berlim, mas por outro lado, consegue-se comprar ao final da tarde o peixe acabado de ser pescado e o marisco ainda vivo. Pequenas diferenças, gostos incomparáveis mas uma sensação única de estar sempre de costas para o sol. Como é banhada pelo oceano Indico, a costa moçambicana causa muita estranheza a todos aqueles que estão habituados a ver o sol descer em direcção ao mar, através da linha do horizonte arrastando atrás de si as cores intensas do verão. Muitas vezes se sente que o tempo pára nas praias moçambicanas, deixando uma sensação de eternidade em apenas algumas horas na praia. Depois de muitos mergulhos e muito sol é hora de encher a geleira de marisco e regressar a casa. Para que a aventura seja completa, é preciso ainda esperar que o famoso batelão atravesse para o outro lado da margem os mais de 20 carros que se encontram à nossa frente, que durante o tempo de espera vão fugindo à subida da maré que vai galgando o terreno e inundando as estradas. A cada nova viagem, o capitão arranja uma solução para que os carros possam entrar no barco e assim chegarem ao outro lado. O sol põe-se e o calor nem por isso arreda pé. As crianças aproveitam para vender castanha de caju a todos os banhistas que vão esperando pacientemente dentro dos carros, ao mesmo tempo que os artistas locais desfilam com as suas peças em madeira de pau-preto e sândalo, fazendo as delicias de todas as senhoras que aí se encontram. Domingo é sinónimo de festa, já que na segunda-feira a rotina regressa e é preciso esperar mais cinco dias para que tudo se repita desta forma. África tem encantos sem explicação possível e de uma intensidade brutal. A força da natureza num alto estado de pureza, muitas vezes desconcertante e até assustador. Por vezes não é fácil encarar a dura realidade de alguns países africanos em que o desenvolvimento ainda está longe e que ao mesmo tempo contrapõe essa ausência com maravilhas naturais. Tudo se compara e ao mesmo tempo nada é comparável. É estranho, mas depois disto tudo, a semana de trabalho vai ser bem mais fácil de suportar e até mesmo os 33 graus centígrados que se fazem sentir diariamente nesta altura do ano, já são um pormenor como outro qualquer.

in: Semanário Económico, CASUAL